Falar outra língua é básico
AMBIÇÃO GLOBAL
O dentista mineiro Rodrigo dos Santos (de óculos) e colegas no curso de imersão em inglês: planos para atender clientes estrangeiros
Na maioria das profissões, o domínio de um idioma estrangeiro sempre contou pontos no currículo. Antigamente, nas empresas, eram poucos os funcionários que dispunham dessa vantagem, e a eles recorriam os colegas quando precisavam traduzir uma palavra ou um texto. Esse mundo, evidentemente, ficou para trás. Falar outra língua, principalmente o inglês, tornou-se uma obrigação para quem pretende subir na vida. A novidade é que já não basta falar o idioma. A exigência nos bons empregos, agora, é que se tenha fluência ao usá-lo para conversar. Tropeçar nas palavras, gaguejar em busca da expressão correta, exibir um sotaque incompreensível – tudo isso faz parte de um tempo romântico em que era divertido falar "portunhol" com os argentinos e os americanos achavam pitoresco o esforço dos brasileiros para negociar no idioma de Shakespeare. A corrida em busca da fluência em outra língua pode ser medida pela quantidade de brasileiros que viajam para o exterior com o fim específico de estudá-la. Segundo dados da Brazilian Educational & Language Travel Association (Belta), associação que reúne as principais instituições que trabalham com cursos, estágios e intercâmbio em outros países, 120 000 brasileiros viajaram com esse objetivo em 2008, contra 86 000 em 2007 e 71 000 em 2006.
Diz o paulista Luiz Carnier, professor do MBA ministrado totalmente em inglês da Business School São Paulo: "Nos anos 70, para alguns cargos específicos, as empresas exigiam apenas comunicação por escrito em outros idiomas. Com o avanço da tecnologia, o ritmo dos negócios mudou e aumentou a exigência por fluência, pronúncia e conhecimento da cultura do interlocutor". Fluência num idioma não significa dispor de um vocabulário imenso, como os nativos do país onde ele é falado. Significa dominar amplamente o vocabulário usado na profissão em que se trabalha. O mundo dos negócios, pela natureza globalizada dos mercados, é hoje o terreno onde fica mais evidente a exigência do domínio de idiomas. "Quando grandes volumes de dinheiro estão em jogo, o executivo precisa se comunicar adequadamente para garantir a precisão absoluta da negociação", diz Augusto Carneiro, da firma carioca de recolocação profissional Zaitech Consulting.
Em outras profissões existe a mesma premência de falar outra língua com desembaraço. O dentista mineiro Rodrigo dos Santos, de 35 anos, passou o Carnaval com outras quinze pessoas num programa de imersão em inglês realizado pela escola de idiomas Celil num sítio no sul de Minas. Durante cinco dias, os participantes só puderam falar em inglês, até mesmo ao conversar com os familiares por telefone. Santos explica que buscou o curso de imersão para ampliar a clientela. "Tenho planos de atender em meu consultório, em Belo Horizonte, pacientes estrangeiros que fazem turismo de saúde no Brasil", diz. Há duas semanas, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) determinou que, a partir de março, todos os pilotos brasileiros que realizam voos para o exterior apresentem certificado que comprove capacidade de comunicação operacional em inglês.
A primeira pergunta que surge a quem se impõe o desafio de falar outro idioma fluentemente é: será preciso passar um tempo no exterior? Não necessariamente. Um bom começo é identificar as estratégias que funcionam melhor para cada tipo de pessoa. Diz a linguista Neide Maia Gonzalez, da Universidade de São Paulo: "Algumas pessoas têm mais facilidade em apreender informações visualmente. Outras, por meio dos sons. Há as que se dão bem com técnicas de memorização. Cada um deve descobrir com quais técnicas se afina melhor e assumir o controle de seu aprendizado". Os vínculos afetivos que existem – ou se desenvolvem – com a cultura do país onde o idioma é falado podem contribuir para sua assimilação. Ouvir músicas americanas lendo as respectivas letras e assistir aos filmes de Hollywood tentando associar as vozes com as legendas são técnicas muito usadas para que o aprendizado não seja um esforço entediante. Também unindo o útil ao agradável, há diversos cursos que combinam o estudo do idioma – principalmente italiano, espanhol e francês – à prática da gastronomia.
A paulista Marília Ramos, administradora de empresas de 26 anos, ilustra os benefícios de transformar o estudo numa forma de entretenimento. Sem nunca ter morado no exterior, ela conquistou uma base sólida em inglês e espanhol com cursos de idiomas e muita dedicação nas horas livres. "Para mim é um grande prazer estudar idiomas, então sempre que posso leio em outra língua e vejo filmes sem legendas", ela conta. Marília trabalha no departamento de marketing de uma multinacional, prepara relatórios e faz apresentações em inglês e espanhol. Para quem gosta de despender várias horas diante do computador, a internet está cheia de ferramentas de suporte para o aperfeiçoamento em idiomas. O gaúcho Felipe Hentz, de 33 anos, técnico em informática em Porto Alegre, conta que, além de tomar aulas particulares, ouvir rádios como a inglesa BBC e ler jornais estrangeiros foram recursos essenciais para sua fluência no inglês. "Na multinacional em que trabalhei até dois anos atrás, fui promovido para um departamento no qual fazia teleconferências com os executivos americanos da matriz", ele relata. Depois de descobrir quais recursos são ideais para chegar à fluência num idioma, vem a fase crucial: praticar muito até se sentir à vontade para conversar naturalmente – e sem gaguejar.
(Renata Moraes)
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